Publicado: Segunda, 02 Junho 2014 14:35
  Autor: Paulo Cardim
  Fonte: Portal Belas Artes


No último dia 27, a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados realizou uma audiência pública, para comemorar os 10 anos do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, o Sinaes, instituído pela Lei nº 10.861, de 2005. Participei do evento, como convidado, na qualidade de presidente da Associação Nacional de Centros Universitários (Anaceu), para falar sobre os desafios do Sinaes e apresentar uma proposta de aprimoramento para o Sistema, indispensável à melhoria contínua da qualidade da educação superior.

 

Entre os desafios do Sinaes, inclui a necessidade de aprimorar a lei, corrigir as distorções de sua aplicação e aprimorar os instrumentos e critérios de avaliação adotados pela Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes) e implementados pelo Inep, o órgão executivo do Sinaes.

Nesses dez anos de existência, com três ciclos avaliativos trienais completos, podemos fazer um balanço do Sinaes, levantando pistas que possam sinalizar a consolidação desse sistema e as mudanças necessárias para o seu aprimoramento.

Nesses dez anos de vida o Sinaes vem cumprindo a maioria de suas  finalidades gradualmente, com altos e baixos, contribuindo efetivamente para a melhoria da qualidade da educação superior. Tem falhado, contudo, no que diz respeito às diferenças e à diversidade e identidade das instituições de educação superior. As universidades, os centros universitários e as faculdades têm sido avaliados, nos instrumentos de avaliação in loco e na construção do Conceito Preliminar de Curso (CPC) e do Índice Geral de Cursos (IGC), como se fossem da mesma categoria administrativa, como se tivessem a mesma missão institucional e legal.

Os instrumentos do Sinaes, por exemplo, estão exigindo da universidade, do centro universitário e da faculdade os mesmos percentuais de professores com doutorado e mestrado, além da exigência de professores em tempo integral. Esse tem sido um dos pontos fracos da operacionalização do Sistema, que descumpre o inciso III do art. 2º, que determina “o respeito à identidade e à diversidade de instituições e de cursos”.

O caráter público de todos os procedimentos, dados e resultados dos processos avaliativos do Sinaes, assegurado pelo inciso II do referido art. 2º, é uma das conquistas mais importantes para a transparência, a visibilidade dos resultados das avaliações para a comunidade acadêmica e a sociedade. Esse dispositivo legal não é atendido nas ações de difusão dos resultados dos atos avaliativos do Sinaes.

Os indicadores CPC e IGC, que não integram o Sinaes, são usados de forma indiscriminada pelo MEC nos processos de regulação e de supervisão e acabam por corromper o Sinaes, por não comtemplarem todos os indicadores e critérios de avaliação dos instrumentos de avaliação que, na maioria, atendem aos princípios e objetivos do Sinaes.

O Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes, o Enade, criado pelo art. 5º, deveria aferir o desempenho dos estudantes, ou seja, o processo de aprendizagem. Alguns pontos, porém, não estão sendo atendidos como exige o citado artigo.

O instrumento destinado a levantar o perfil dos estudantes, contemplado no § 4º, é um extenso questionário que os estudantes submetidos ao Enade devem responder obrigatoriamente. O objetivo de “levantar o perfil dos estudantes” foi abandonado pelo MEC, transformando esse instrumento na avaliação dos cursos submetidos ao Enade. Esse questionário acaba por fornecer insumos para a composição do CPC e, por consequência, do IGC, indicadores à margem da Lei nº 10.861.

A Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior – Conaes é criada pelo art. 6º com as atribuições de propor políticas, diretrizes e ações para a efetiva implementação do Sinaes. A composição da Conaes, fixada no art. 7º, não oferece condições de participação equânime da livre iniciativa nesse processo, como seria de se esperar de uma comunidade que representa quase 90% das instituições de educação superior e 73% das matrículas nos cursos superiores.

Na composição da Comissão Própria de Avaliação, a CPA, criada pelo art. 11, é vedada uma “composição que privilegie a maioria absoluta de um dos segmentos”. No caso da Conaes, o segmento público é maioria mais do que absoluta, embora seja minoria em instituições e nas matrículas: dos treze membros, doze são ligados ao MEC e a instituições públicas. A livre iniciativa tem apenas um representante. O princípio do art. 11 deve ser aplicado na composição da Conaes.

O art. 10, em consonância com o § 1º do art. 46 da LDB, estabelece que os resultados considerados insatisfatórios nas avaliações promovidas sob a égide do Sinaes “ensejarão a celebração de protocolo de compromisso, a ser firmado entre a instituição de educação superior e o Ministério da Educação”. Esse dispositivo também vem sendo desrespeitado sistematicamente pela área executiva do MEC.

O aprimoramento da Lei nº 10.861 e de algumas práticas do Sinaes é o desejo unânime de todas as entidades representativas da livre iniciativa na educação superior. Em todas as oportunidades, defendemos de forma intransigente o Sinaes, pugnando por algumas mudanças, mas, principalmente, lutando para a correção de rumos equivocados adotados pelo Ministério da Educação na sua operacionalização.

Tendo por objetivo aprimorar o Sinaes para a sua consolidação, em nome da Associação Nacional de Centros Universitários (ANACEU) oferecemos à Comissão de Educação da Câmara dos Deputados as seguintes sugestões:

  1. I. Alterações na Lei nº 10.861:

a)     dar nova redação ao § 3º do art. 5º, para que a periodicidade do Enade seja quinquenal: “§ 3º A periodicidade máxima de aplicação do ENADE aos estudantes de cada curso de graduação será quinquenal”;

b)    dar nova redação ao § 4º do art. 5º, para proibir o uso do questionário preenchido pelos estudantes para outros fins que não levantar o seu perfil: “§ 4º A aplicação do ENADE será acompanhada de instrumento destinado a levantar o perfil dos estudantes, relevante para a compreensão de seus resultados, proibido o seu uso para outros fins”;

c)     dar nova redação ao § 5º do art. 5º: “§ 5º O Enade é componente curricular obrigatório dos cursos de graduação, sendo inscrito no histórico escolar do estudante o conceito por ele obtido e a sua situação regular com relação a essa obrigação, atestada pela sua efetiva participação ou, quando for o caso, dispensa oficial pelo Ministério da Educação, na forma estabelecida em regulamento”;

d)    dar nova redação ao art. 7º para alterar a composição da Conaes, para que  as IES particulares tenham representação mais expressiva.

  1. II. Correções na aplicação da Lei nº 10.861:

a)     aplicação integral do art. 10 da Lei nº 10.861, combinado com o § 1º do art. 46 da Lei nº 9.393, de 1996, indispensável ao desencadeamento do processo de saneamento das possíveis deficiências identificadas em cursos e instituições de educação superior, sendo nulo qualquer processo que descumprir os referidos dispositivos;

b)    adequação dos instrumentos de avaliação in loco institucional e de cursos aos princípios e objetivos do Sinaes (arts. 2º, 3º e 4º), especialmente, para o “caráter público de todos os procedimentos, dados e resultados dos processos avaliativos” e “o respeito à identidade e à diversidade de instituições e de cursos” (gn);

  1. III. Aplicação do CPC e do IGC:

a)     o CPC e o IGC poderão ser aplicados nos processos de supervisão, como sinalizadores de possíveis deficiências, mas qualquer ação punitiva deverá ser precedida de i) avaliação in locoii) assinatura do protocolo de compromisso; iii) avaliação in loco ao final do cumprimento do protocolo de compromisso;iv) renovação de reconhecimento do curso ou recredenciamento da instituição, quando o conceito da avaliação in loco for igual ou superior a três; v) aplicação das penalidades previstas no art. 10 da Lei nº 10.861, quando o conceito da avaliação for igual ou inferior a dois, mediante prévio processo administrativo;

b)    excluir o CPC e o IGC como indicadores de qualidade de cursos de graduação, para incluir ou excluir cursos no Prouni e no Fies, a fim de cumprir a Lei nº 11.509, de 2007 e demais legislação;

rever e aprimorar as fórmulas de composição do CPC e do IGC, com a participação de todos os segmentos da educação superior pública e particular, delas excluindo as respostas dos estudantes ao questionário do Enade.

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