Publicado: Quarta, 22 Janeiro 2014 16:10
  Fonte: Portal Academia Brasileira de Ciências


Diretor de projetos do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), o Acadêmico Wanderley de Souza é também docente do Instituto de Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde chefia o Laboratório de Ultraestrutura Celular Hertha Meyer. Ontem, dia 21 de janeiro de 2014, um artigo de sua autoria foi publicado no jornal Monitor Mercantil. Leia abaixo, na íntegra, texto que trata do desequilíbrio existente entre apoio à pesquisa e à inovação no Brasil:


"O período 2000-2010 foi extremamente rico para o desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro, bem como para iniciar um processo de conscientização da necessidade de que o processo de inovação tecnológica ocorra no Brasil. Para melhor avaliar o que ocorreu neste período alguns números e fatos precisam ser apresentados.

Inicialmente vamos aos dados. Em 2000 contávamos com cerca de 28 mil doutores e 12 mil grupos de pesquisa. Já em 2010, estes números chegaram a 82 mil e 22 mil, respectivamente. Em 2000, os pesquisadores brasileiros publicaram 10.462 artigos em revistas internacionais, ocupando a 17ª posição mundial. Já em 2009 tivemos 32.100 publicações e alcançamos a 13ª posição.

Que fatos explicam estes números? Não há nenhum segredo. Após anos de recursos decrescentes para C&T no Governo FHC, este mesmo governo foi criativo em iniciar um conjunto de fundos setoriais para apoio à atividade científica, embora os recursos destes só tenham sido efetivamente utilizados, e com grande sucesso, pelo Governo Lula.

Como conseqüência, criou-se uma massa crítica de atividades científicas que poderiam disparar a tão necessária utilização de conhecimento científico e tecnológico em novos processos e produtos geradores de riqueza.

Entramos então em uma nova fase na qual ênfase especial vem sendo dada à atividade de inovação tecnológica. Esta, no entanto, só terá êxito se for criado o ambiente propício a que o mundo científico e tecnológico interaja naturalmente com o setor industrial. Esta interação não pode ser forçada, como alguns desejam, mas induzida.

Tentativas de forçar as instituições científicas a atuar na área da inovação não vão levar a nada, exceto ao mau uso dos recursos públicos. No entanto, poderá levar ao declínio da atividade científica, diminuindo assim as chances de melhor entrosamento entre o setor científico e o setor empresarial.

Desde já é importante ficar claro que a atividade de inovação deve ocorrer na empresa, seguindo a exitosa experiência internacional. Por este motivo me parece um equívoco, que poderá levar a um atraso no desenvolvimento industrial brasileiro, que a área da inovação esteja exclusivamente sob a coordenação do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT, que recentemente incorporou também a palavra inovação, passando a ser MCTI).

Me parece fundamental que o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que lida diariamente com o setor produtivo nacional, tenha uma participação mais ativa no apoio à inovação tecnológica, inclusive com recursos para apoiar o setor.

A comunidade científica brasileira já percebe um claro desequilíbrio, que se acentua a cada ano, entre os orçamentos para pesquisa básica e para inovação no MCTI. Em 2005, as áreas de C&T e de Inovação investiram R$ 2,8 bilhões e R$ 800 milhões, respectivamente, o que correspondia a cerca de 77% e 23%, respectivamente. Em 2010, as áreas de C&T e a de inovação investiram R$ 5,2 bilhões e R$ 2,3 bilhões, respectivamente, o que correspondia a cerca de 70% e 30% do orçamento global do MCTI. Já em 2013, as expectativas apontam para valores da ordem de R$ 7,2 bilhões e R$ 5,5 bilhões, sendo os percentuais de 56% para C&T e de 43% para inovação nas empresas.

Nada contra o aumento significativo nos recursos para inovação, que inclusive surgem da capacidade da equipe que lida com esta área de conseguir mais recursos oriundos de outras fontes. O que é lamentável, e grave, é que os recursos para a pesquisa básica, que deveriam vir do Tesouro Nacional, estão crescendo menos e diminuindo per capta, já que tem aumentado o número de pesquisadores e de grupos de pesquisa. Há um claro descompasso entre o C&T e o I do MCTI, e a correção deveria ocorrer por um aumento significativo do orçamento do CNPq, com recursos do Tesouro."

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