Publicado: Quinta, 29 Agosto 2013 06:27
  Autor: Paulo Nathanael Pereira de Souza
  Fonte: Correio Braziliense

 

Educador, foi presidente do Conselho Federal de Educação

A crise educacional no Brasil deixou de ser tema do círculo dos especialistas para ganhar as ruas e virar preocupação dos jovens — principais vítimas do descalabro que invadiu as escolas. Como qualquer inovação no campo da educação leva sempre de cinco a 10 anos para “pegar” e começar a produzir resultados, não há tempo a perder. Impõe-se implementar com rapidez medidas com potencial para minorar o estado da arte do que aí está. Sábios de plantão invocam a necessidade de novas leis, reformas amplas, profundas e imediatas nos sistemas educativos para reverter o quadro de insucessos que ora se apresenta. 


Que garantias existem de que o melhor caminho seja mesmo esse? Afinal, as grandes reformas da educação havidas no país durante o século 20, a saber: Reforma Capanema (de 1942) e as sucessivas LDBs, que, a partir da Lei 4024/61 se aprovaram no Congresso (Leis nº 5540, de 1968; nº 5691, de 1971; nº 9394/96) pouquíssima influência tiveram na qualificação dos três níveis da escolaridade formal, que continuaram a acumular insuficiências e equívocos até chegar ao clamor das ruas. Ademais, a tramitação de um projeto de lei de reforma costuma levar anos e mais anos em discussão, além de gerar toneladas de emendas com miuçalhas sem-fim. 

Por isso tudo, a reforma global das leis de sistema talvez não fosse o remédio exato e mais eficiente para os males que travam a eficácia do ensino-aprendizagem. Melhor seria proceder-se ao ataque a pontos estratégicos, que impedem o aproveitamento escolar das novas gerações. As principais dificuldades referem-se aos fins e aos meios da ação educativa. A primeira diz respeito aos fins e deve ser claramente posta num documento base, que defina os rumos da política de Estado em relação ao setor. E também leve em conta o interesse nacional no preparo adequado das novas gerações para o enfrentamento dos desafios do século 21. 

Temos tido abordagens dispersas e genéricas desse tema em capítulos da Constituição e da LDB, porém falta especificamente um texto que indique para uma década ou para os próximos 50 anos, nos três graus de ensino, o rumo certo a tomar em relação ao projeto de ensino-aprendizagem com vistas ao futuro. Não basta que o MEC ou as secretarias de educação façam acontecer o dia a dia da escolaridade, sem que haja uma estrela-guia a indicar as linhas mestras de uma ação educativa pertinente, com endereço ao futuro de crianças e jovens. 

Terá que ser documento de Estado que ultrapasse os governos e diga quais as estratégias possíveis de serem adotadas, quer imediatamente, quer a médio prazo tendo em vista as exigências da era do conhecimento e das aspirações nacionais, consubstanciadas na conquista de verdadeira democracia, de desenvolvimento econômico efetivamente sustentável e da prática da autêntica justiça social. Se as escolas não souberem como fazer isso, estarão perdendo tempo, dinheiro e expectativas com seu trabalho.

No tocante aos meios, há que: 
a) Mudar os currículos do ensino básico, modernizando-os, eliminando os excessos de conteúdo e levando o aluno a entender a aplicabilidade dos conceitos teóricos na vida real; 
b) Tornar a alfabetização instrumento eficiente para a ação cultural continuada dos alunos a partir do primeiro ano de escolaridade; 
c) Adotar didáticas associadas às tecnologias da comunicação;
d) Reformular em profundidade a formação dos professores a fim de capacitá-los ao uso das referidas tecnologias em sala de aula, bem como instrumentá-los, pela ampliação da carga horária da prática de ensino nos cursos de licenciatura, a exercerem sua autonomia pedagógica (formular programas de ensino-aprendizagem, executá-los com êxito e avaliá-los no tocante aos ganhos periódicos de aprendizagem dos alunos).

Quanto aos órgãos superiores dos sistemas de ensino, devem passar de patrões das escolas, que hoje são, a assessores do processo educativo, libertando o professorado da excessiva tutela e cuidando para que a profissão do magistério volte à dignidade histórica e se enquadre em carreiras bem remuneradas. Soluções como essas e outras, que puderem ser detectadas por avaliações rigorosas das falhas que ora ocorrem no dia a dia das escolas, certamente acarretarão maior eficiência do que novas leis de reforma — sempre muito difíceis de aprovar e implementar. Quanto a recursos financeiros, é obvio que os há. Segundo estudos recentes realizados pela OCDE, o Brasil destina à educação em percentual do PIB mais dinheiro do que países do Primeiro Mundo. O que precisamos não é apenas de mais recursos (embora nunca sejam demais), mas de maior competência para gastá-los. Sem desperdício.

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