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  Publicado: Terça, 27 Maio 2014 14:43
  Fonte: O Globo


Dirigente minimiza polêmica envolvendo o corte de 110 bolsas do CSF no Canadá e na Austrália.

Melhorar a qualidade da pesquisa científica e expandir os cursos de pós-graduação (mestrado e doutorado) nas universidades do país. Esses são alguns dos desafios a serem enfrentados pelos órgãos responsáveis pela área educacional no Brasil. Um dos órgãos que têm exatamente essa função é a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Um dos problemas a enfrentar está no funcionamento do Programa Ciência sem Fronteiras (CSF), criado em 2011, que tem metas ousadas de concessão de bolsas fora do país, mas enfrenta desafios, como a recente decisão de mandar de volta ao Brasil 110 alunos do Canadá e da Austrália por falta de proficiência em língua estrangeira. De passagem pelo Rio nesta sexta-feira para receber um prêmio em homenagem aos seus dez anos à frente da Capes, o presidente da entidade, Jorge Guimarães, conversou com O Globo sobre esse e outros assuntos.

 

O Globo - O Brasil ainda não tem uma tradição em pesquisas científicas de excelência. Como o senhor avalia isso? O que pode ser feito para ampliar esses índices?

Jorge Guimarães - Olha, até não temos o padrão dos países desenvolvidos, mas temos o 13º lugar (quantitativamente) e estamos crescendo muito. Não deixamos a desejar em algumas áreas. Tudo o que deu certo no Brasil passou pela Capes. Por exemplo: os doutores da Embrapa se formaram em universidades. O sucesso das urnas eletrônicas, a busca por petróleo em áreas profundas, tudo isso é prova de sucesso da nossa ciência. Se você vai nas universidades federais de Minas ou do Rio Grande do Sul, por exemplo, você vê que a influência da engenharia nas duas é enorme.O impacto da nossa ciência, ainda que a gente não produza tanta patente, é muito alto. Fizemos o motor a álcool, e cadê a patente? Temos a melhor automação bancária do mundo. Isso é resultado da formação de recursos humanos.

- No ano passado, 60 cursos de pós-graduação foram reprovados no Brasil. Houve muitas notas 3 e 4 também, muito baixas. Como melhorar esses dados?

- Este é um processo que vem melhorando com os anos, principalmente pelo rigor das avaliações (dos cursos). Noventa e seis por cento deles não estão satisfeitos com a nota que tem, claro, pois só 4% têm nota 7 (pontuação máxima). É muito pouco. Doze por cento tiveram nota 6 e 7. São esses 12% que nos vão permitir internacionalizar as universidades brasileiras. Eles são a ponta de lança. Mas as nossas universidades são muito grandes. Internacionalizar uma USP, por exemplo, é dificil. Por quê um curso tem nota 3 ou 4? Geralmente são os cursos mais novos, de grupos de professores que entraram agora, não têm muitos mestres e doutores. É vergonhoso um curso ter nota 3? Não. a maioria dos cursos começou com nota 1 e hoje muitos deles são 7. É uma trajetória natural da pós-graduação. Temos que vencer obstáculos e temos metas para alcançar os melhores índices.

- Até que ponto a má qualidade das escolas de graduação do ensino superior particular influenciam na outra ponta, na concessão de bolsas de mestrado e doutorado?

- O governo nos propôs colocar a formação de professores do ensino básico e começamos então a atuar nisso. Hoje o grande desafio nosso é a educação infantil e o ensino médio. Claro que isso influencia o ensino superior. Se temos 8,5% da população nas universidades, claro que a demanda (por cursos) é incrível. Por isso a proliferação. Boa parte da expansão das universidades, entre elas as que trazem problema, começaram há muito tempo. Mas é preciso pensar que hoje não tem mais aula ruim, o aluno faz sua carreira. Dessas universidades brasileiras, quase todas têm acesso a portais de periódicos, que são uma biblioteca virtual de qualidade, onde estão todas as publicações, inclusive as universidades particulares têm acesso. O aluno tem como fazer seu melhor, mesmo estando numa universidade sem qualificação tão grande. Estamos trabalhando para que as melhores universidades privadas venham para o “guarda-chuva” da Capes.

- Sobre o programa Ciência Sem Fronteiras, a meta de 101 mil bolsas a serem concedidas até 2015, será cumprida?

- Sim. Hoje estamos com 81 mil entre os que já viajaram e os que estão viajando - entre as bolsas concedidas pelo CNPq e pela Capes. Faremos novos editais de chamada. O programa é um sucesso. Acabei de visitar os alunos na Alemanha e na Inglaterra e vi a satisfação dos professores com nossos alunos.

- Qual a verba para o Ciência Sem Fronteiras em 2014?

- São R$ 3,2 bilhões para os quatro anos pela parte do governo. Outra parte vem das instituições com perfil de empresa, como a Petrobras (que financiam o programa também). Todos os países estão reconhecendo o sucesso do Ciência sem Fronteira.

- Mas, recentemente, 110 bolsistas do Ciência sem Fronteiras receberam a notícia de que teriam que voltar para o Brasil. A maior parte pela questão da proficiência em língua estrangeira. Isso é uma encruzilhada. Como fica a situação?

- Eles não conseguiram (se manter nas instituições fora do país), sinto muito! Foram selecionados por mérito e alcançaram 600 pontos no Enem (critérios para ser aceito no programa). Houve fatores para que eles não alcançassem a proficiência. Se deixássemos essas pessoas lá, a imprensa ia reclamar da gente. Ora, 110 em 62 mil pessoas (com bolsa fora do país) é muito pouco, sinto muito. Não é um prejuízo para o programa. É o mínimo do mínimo do mínimo. Tem muita falácia sobre isso. Os nossos alunos voltam querendo mudar nossos sistemas de “aulinha”, pensando em muito estudo, trabalho, mão na massa.