Publicado: Terça, 12 Março 2013 12:33
  Autor: Jorge Arbache
  Fonte: Valor Econômico - São Paulo/SP

O retorno do investimento em educação está caindo no Brasil. Essa afirmação destoa do senso comum de que vale a pena estudar mais. Demanda insatisfeita por pessoas qualificadas, aumento do tempo que os jovens estão se dedicando à educação e crescimento da disputa por vagas nas melhores universidades e cursos estariam por trás desse senso comum.

Mas a educação, que é apontada há décadas como a principal explicação do diferencial de salários e da elevada desigualdade de rendimentos no Brasil, vê seu retorno convergir, ainda que lentamente, para padrões internacionais. Esse \"novo normal\" é bem-vindo e reflete, ao menos em parte, os efeitos positivos de políticas sociais voltadas para a base da pirâmide e de aumento das oportunidades de acesso à educação.

Em 2002, trabalhadores com ensino fundamental completo ganhavam 13% a mais que trabalhadores com idade e outras características pessoais e demográficas iguais, incluindo experiência no trabalho, e atuando na mesma atividade econômica, em firmas de tamanho similar e em regiões geográficas e condições de trabalho comparáveis, mas com ensino fundamental incompleto. Em 2011, essa diferença salarial havia caído para 9%, uma contração de nada menos que 30%. Com relação aos trabalhadores com ensino médio completo, a diferença para os trabalhadores com ensino fundamental incompleto caiu de 47% para 33% no mesmo período. A diferença também caiu com relação aos trabalhadores com ensino superior completo, passando de 140% para 105%. Registrou-se queda inclusive com relação aos trabalhadores com pós-graduação, que passou de 214% para 180% no mesmo período.

Vários fatores contribuíram para reduzir o diferencial de salários entre os trabalhadores com mais e menos educação. A política de recuperação do salário mínimo foi o principal deles. Descontada a inflação, o salário mínimo aumentou 57% entre 2002 e 2011, muito acima do aumento real de 8% do salário médio do trabalho principal das pessoas com carteira no setor privado. Com isso, a diferença entre os dois salários despencou. De fato, o salário médio deste último grupo correspondia a 4,2 salários mínimos em 2002; em 2011 era de 2,9 salários.

A relevância da política de recuperação do salário mínimo para os retornos da educação decorre da substancial parcela de trabalhadores com pouca escolaridade que é remunerada por aquele salário ou cujos salários são referenciados, em alguma medida, por ele. De acordo com o Censo de 2010, nada menos que 30% da população ocupada ganhava até um salário mínimo e 61% ganhava até dois salários mínimos naquele ano. Esses trabalhadores tinham, em sua grande maioria, escolaridade equivalente a até ensino fundamental incompleto e uma parcela menor a ensino fundamental completo.

Outro importante fator para explicar a queda do retorno da educação foi a rápida mudança na distribuição de escolaridade na força de trabalho adulta. De um lado, caiu substancialmente a percentagem de trabalhadores com ensino fundamental completo ou incompleto. De outro lado, aumentou, também substancialmente, a percentagem de trabalhadores com ensino médio completo ou incompleto. A parcela de pessoas com 25 anos ou mais de idade sem instrução ou ensino fundamental incompleto caiu de 60% para 46% do total entre 2002 e 2011. Já a parcela das pessoas com ensino médio completo saltou de 16% para 25%, enquanto a parcela com ensino superior completo e incompleto passou de 10% para 15% no mesmo período.

A mudança na distribuição da escolaridade dos trabalhadores adultos se refletiu na oferta e, consequentemente, nos salários relativos dos grupos de escolaridade, influenciando os retornos da educação. Esse efeito deverá ser ainda mais contundente para as gerações que ainda chegarão ao mercado de trabalho devido à contínua queda da desigualdade do acesso à educação no Brasil.

Por fim, o aumento do setor de serviços na economia também beneficia os trabalhadores menos escolarizados. Em 1980, o setor de serviços respondia por 45% do Produto Interno Bruto, mas, em 2011, ele já era responsável por 69%. O setor de serviços estava por trás de 27% dos novos postos formais de trabalho criados no setor privado em 2002. Em 2011, aquela participação já era de nada menos que 51% e chegava a 74% se consideradas as novas vagas no comércio. Isso equivale a dizer que 7,4 de cada 10 pessoas que buscam trabalho acabarão no setor de serviços. Logo, o setor de serviços tornou-se largamente dominante e determinante do perfil e das condições do mercado de trabalho brasileiro.

Como os serviços em geral são intensivos em trabalho pouco qualificado, a sua expansão favorece especialmente a demanda e remuneração dos trabalhadores com essas características.

Mas, se o retorno do investimento em educação está caindo, por que então as pessoas estão estudando mais, e não menos? Na verdade, a educação tem se tornado mais, e não menos relevante para se competir pelos melhores empregos, o que decorre do uso mais intensivo de novas tecnologias no ambiente de trabalho e da maior integração do Brasil à economia mundial. Além disso, os retornos da educação no Brasil ainda são muito elevados quando comparados a investimentos alternativos.

Os impactos sociais e econômicos positivos das políticas de recuperação do salário mínimo e de acesso à educação serão ampliados se acompanhados por reformas que estimulem a meritocracia e o aumento da produtividade do trabalho. Com isso, aquelas políticas terão uma contribuição ainda mais relevante para o crescimento sustentado.

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