Publicado: Terça, 06 Outubro 2015 08:44
  Autor: Gabriel Mario Rodrigues
  Fonte: Portal ABMES


Gabriel Mario Rodrigues 1

Pare de [querer] salvar o mundo, comece a reinventá-lo. (Richard Branson[1]).

 Após 20 anos de trabalho, um executivo é demitido da empresa. Na despedida, entrega três envelopes ao seu sucessor informando que ele deveria abri-los na medida em que “as coisas” não dessem certo. O novo gestor, todo empolgado, foi criando projetos para mostrar a sua capacidade.


Passados 10 meses, observou que seus processos gerenciais não alcançavam êxito e que os resultados prometidos eram pífios. Lembrou-se dos envelopes e, ao abrir com curiosidade o primeiro, leu: “A primeira confusão já apareceu? A vida executiva é assim mesmo, meu caro. Sossega e ponha a culpa nos métodos confusos e antiquados de quem estava no cargo antes de ti: eu”. Ele assim o fez. Foi ao dono da empresa e disse: “Recebi uma herança maldita”. Explicou que era fundamental tomar providências enérgicas para recolocar a companhia no rumo certo. Ganhou uma tapinha nas costas, que interpretou como um sinal de estímulo, e seguiu mais confiante a sua trajetória.

Como nada é muito previsível na atividade empresarial, o tempo foi passando até que, 11 meses depois, os clientes antigos romperam acordos, os custos cresceram demais, os funcionários de qualidade bandearam-se para a concorrência e a empresa ficou em dificuldades. E, sem pestanejar, o executivo abriu o segundo envelope. Lá estava: “A crise retornou mais forte? Agora chegou a vez de agir. Corte custos drasticamente. Dê férias coletivas, reduza os estoques. Enxugue estruturas. E demita meio mundo.” E novamente levou sua nova estratégia ao chefe. Aprovada, trocou fornecedores, apertou o cinto, racionou o cafezinho, uniu departamentos, demitiu funcionários e cortou qualquer contratação.

Quando pensava que tudo ia bem, o Governo anunciou o fim dos subsídios para o setor e, entre outras medidas, elevou os impostos. Então os consumidores se retraíram e a produtividade caiu drasticamente. O executivo contratou diversas consultorias para resolver os problemas e, como nada dava certo, foi abrir o terceiro envelope. Com lágrimas nos olhos, leu: “Agora chegou a sua vez. Escreva três bilhetes e os coloque em envelopes para seu sucessor”.

Esta historinha nos remete a um fato importante: os processos gerenciais preocupam cada vez mais os empresários e os dirigentes de instituições, independentemente de sua natureza e mesmo de sua dependência administrativa, pública ou privada.

Ricardo Guimarães, sócio-diretor da Thymus Branding, defende a ideia de que o exército foi, e continua sendo, uma das referências para a formação da cultura organizacional que existe nas empresas. Segundo ele, a estrutura hierárquica, a disciplina, as metas, os manuais, a carreira, o comando e o controle como princípios de gestão vieram da primeira organização que existiu entre os homens – “os guerreiros”.

Essa cultura permeia tudo, explica Guimarães:

“Desde a educação que vem de casa, passando pelas escolas, universidades e MBAs até a integração dos funcionários nas empresas como um processo de preparação de indivíduos obedientes, hábeis e valentes que se colocarão a serviço da corporação que os reconhecerá por meio de promoções ao longo da vida. Nela, os interesses da organização prevalecem aos dos indivíduos.”

Brains, not bullets, matéria da The Economist, de outubro de 2007, citada por Guimarães, considera que, na velocidade com que o cenário muda atualmente, a vitória na guerra não é a do mais forte, mas daquele que for mais ágil na atualização de suas estratégias. Isto tem a ver com tecnologia de comunicação para detectar e comunicar ameaças e oportunidades, a fim de rever formas de agir e fazer ajustes em suas táticas.

Após essa introdução, chego ao ponto central do artigo: o design thinking.[2] Trata-se de um tema novo que, se bem entendido, pode ser adaptado e adotado também no planejamento das instituições educacionais.

As organizações em geral continuam amarradas ao paradigma do “fazer mais do mesmo”, introduzido há 250 anos pela Revolução Industrial, e, portanto, têm poucas chances de promover rupturas no curto e médio prazos.

O cenário atual da economia de redes revela uma série de outros possíveis modelos de negócios, de utilização de recursos e, consequentemente, de novas formas de relacionamento entre pessoas/clientes e empresas. O momento atual da nossa civilização exige criatividade para resgatar o homem e conferir-lhe poder com o qual possa vislumbrar um futuro mais sustentável e promissor. Na economia colaborativa, inimaginável num cenário tradicional, despontam novas ideias e negócios, que contam com colaboração, inteligência e recursos em rede, como o WhatsApp, oAirBnb, o Uber e toda uma série de plataformas e aplicativos.

Assim, o design thinking, também chamado de design centrado no ser humano (human centric design), surge como uma abordagem para: a) resolver problemas das organizações, pelo fato de associar pensamento crítico, lógica, imaginação, intuição e raciocínio sistêmico; b) explorar as possibilidades de obtenção de resultados desejados, que beneficiem o usuário final e c) adotar a multi/transdisciplinaridade e a colaboração como caminhos que levam a soluções inovadoras para negócios.

design thinking aplica a solução de problemas do mesmo modo com que odesigner percebe as coisas e age sobre elas, isto é, ele enxerga como problema tudo aquilo que prejudica ou impede a experiência (emocional, cognitiva, estética) e o bem-estar das pessoas. Como os problemas são sempre multifacetados, odesigner precisa, para identificá-los e gerar soluções, mapear a cultura, os contextos e as experiências pessoais para ter uma visão mais ampla e assim melhor identificar as barreiras e gerar alternativas para transpô-las. Para tanto, prioriza o trabalho colaborativo entre equipes multidisciplinares e trabalha em um processo multifásico, que permite interações e aprendizados constantes. Isso faz com que o designeresteja sempre experimentando novos caminhos e sempre aberto a novas alternativas, nas quais o erro pode/deve gerar aprendizados que o ajudam a traçar direções alternativas e identificar oportunidades para a inovação.

Essa visão dos designers chamou a atenção de gestores, que dela extraíram um novo jeito de olhar para seu negócio, colocando as pessoas como o centro de novos processos. O papel do líder nesse contexto é de fundamental importância, pois a cultura da inovação exige incentivo ao fortalecimento dos recursos humanos de uma empresa para que todos assumam riscos e responsabilidades. Ninguém mais é uma peça da engrenagem, mas um cérebro emancipado e pensante.

O impacto do design thinking aplicado à educação é duplo: de um lado, exige múltiplas abordagens, o que incentiva os alunos a procurarem na multi/inter/transdisciplinaridade a solução para um dado problema; de outro, enfatiza a colaboração – quanto mais compartilho, mais retorno tenho – e o uso de recursos externos para a aprendizagem. Do lado das instituições, é uma visão nova porque deve estar totalmente centrada no sucesso do aluno durante o correr de seu aprendizado e não somente na época da captação das matrículas como acontece hoje.

Permanecerá no setor educacional quem tiver a sensibilidade de perceber que a preocupação central dos dirigentes e dos professores deve ser a atenção multifacetada e absoluta nos estudantes.

[1] Richard Charles Nicholas Branson, bilionário empresário britânico, é fundador dogrupo Virgincujos investimentos vão da música à aviaçãovestuário,biocombustíveis e até viagens aeroespaciais.

[2] Os interessados em aprofundar seus estudos sobre o tema podem acessar um projeto aberto e gratuito na internet chamado “Design Thinking para Educadores” que disponibiliza material, recursos e estudos de caso (http://www.dtparaeducadores.org.br/site/).

Gabriel Mario Rodrigues
Presidente da ABMES e Secretário Executivo do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular

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