Publicado: Sexta, 12 Abril 2013 12:18
  Autor: Gauss M. Cordeiro e Renato J. Cintra
  Fonte: Jornal da Ciência

Em qualquer bom ranking internacional de avaliação de qualidade não é listada nenhuma universidade federal entre as 300 melhores do mundo. Não parece estranho esse fato, pois o Brasil está entre as dez maiores economias do planeta? Existe um gigantismo que assola as nossas universidades federais. Muitos professores só fazem ministrar suas aulas, pois se dedicam a outras atividades que lhes oferecem maior retorno financeiro. Muitos daqueles que possuem compromisso didático não têm qualquer interesse na pesquisa científica, o que reflete o desempenho pífio de qualidade das nossas federais. Os sindicatos são formados, em boa parte, por pessoas que têm pouco comprometimento com a pesquisa de qualidade; costumam falar por todos quando apenas representam uma minoria e têm seus interesses norteados pelo corporativismo exacerbado. Tudo isso reflete na nossa baixa produtividade científica.

Nesse cenário, temos a Lei 12.772/2012, promulgada no apagar das luzes de 2012, que diz em seu artigo 8, parágrafo 1o., que "No concurso público [para a carreira de magistério superior], será exigido o diploma de curso superior em nível de graduação." Até aí, não há nada de novo; tal diploma sempre foi exigido. Entretanto, muitos departamentos também exigiam outros diplomas, como o de doutorado ou de mestrado, a depender de suas especificidades. O objetivo estava claro: contratar os professores melhores qualificados. A novidade está na interpretação da nova lei. Nas maioria das IFES (sendo a UNIFESP uma exceção), as procuradorias jurídicas estão apontando pela ilegalidade em se exigir diplomas adicionais.

O problema vem agora. Os concursos públicos para o magistério superior têm um formato pouco flexível baseado em prova escrita, didática e de títulos, nas quais os procuradores se esforçam em tirar das bancas examinadoras qualquer tipo de avaliação subjetiva. Assim, as chances de um simples graduado realizar provas escrita ou didática comparáveis as de um doutor são altas; pois as provas são julgadas em nível de graduação. Além disso, nesse modelo de concurso, as provas escrita e didática têm peso maior que a prova de títulos. Portanto, o concurso torna-se um instrumento ineficaz para distinguir o mérito acadêmico do candidato ao magistério. Logo, nivela-se por baixo. Por conta dessa famigerada lei, os pesquisadores doutores mais ativos terão que ingressar na carreira acadêmica na categoria mais baixa: professor auxiliar.

 

Certamente, ainda há áreas com carência de doutores ou mesmo de mestres. Nesses casos, um concurso para graduados é inevitável. Mas, em áreas mais maduras do conhecimento, há doutores. Assim, remover das IFES a liberdade de escolher o perfil de seus candidatos é um retrocesso. Na UFPE, por exemplo, vários departamentos fizeram esforços por décadas para atrair bons cérebros, montar quadros de docentes com doutorado nas melhores universidades do mundo e estimular seus docentes sem doutorado a se titularem. Hoje tais departamentos estão entre os mais destacados em produtividade científica do País.

Infelizmente, ao longo dos últimos anos, uma série de eventos se combinam para desmantelar qualquer ambiente acadêmico que pretenda esboçar excelência. Nominalmente, temos: excesso de burocracia que engessa as universidades; introdução de legislações, pareceres e recomendações jurídicas que corroem o mérito e as tradições universitárias (por exemplo, na UFPE, não se pode solicitar uma simples carta de recomendação no processo de seleção de alunos da pós-graduação); indefesa dos valores acadêmicos baseado em mérito; desmotivação dos professores mais destacados; infra-estrutura extremamente precária; nivelamento por baixo; imposição de sistema de quotas para alunos iméritos; vestibular com fraquíssimo crivo de seleção; excessiva preocupações com evasão ou reprovação, mas pouca preocupação em melhorar o ensino; priorização em criar novos cursos e diplomar alunos em grande quantidade sem necessariamente zelo pela qualidade; baixa qualidade do ensino médio que reflete em uma baixa qualidade do ensino superior. Esta lista não é exaustiva. Efetivamente, vem-se introduzindo dispositivos anti-meritocráticos e assistencialistas que exaltam a mediocridade. O estímulo ao esforço e/ou a busca pela excelência está sendo relativizado.


Gauss M Cordeiro e Renato J Cintra são professores e pesquisadores da UFPE

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